A sociobiodiversidade engloba produtos, saberes, hábitos e tradições próprias de um determinado lugar ou território. Trata-se de um conceito relativamente novo, centrado na ideia de visibilidade de identidade e valorização das especificidades e diferenças que foram se conformando nos processos históricos de coevolução socioambiental. Este novo conceito foi apregoado pela Convenção Internacional de Biodiversidade e tenta agrupar aspectos que historicamente foram vistos como separados, mas que integram um mesmo sistema, que pode ser destrinchado em cultura, valores e significados, paisagem, recursos, produtos e impactos deste mesmo sistema.
Os sistemas agros florestais (SAFs) consistem em estratégias de manejo do solo que consorciam, simultânea ou sequencialmente, árvores com cultivos e/ou criações de maneira intencional, visando cumprir funções desejadas por quem maneja o sistema. Entre as muitas formas que estes arranjos de cultivo podem ser pensados, os sistemas agros florestais biodiversos e complexos ressurgem para as sociedades modernas como uma oportunidade de reaprender a conviver com a natureza, uma vez que esta forma de cultivo da terra procura imitar os processos de sucessão. Estes processos ocorrem em ecossistemas considerados naturais, que se formam sem a intervenção humana premeditada, o que contrasta com a estratégia moderna de cultivar, que desconsidera a sucessão natural, a biodiversidade adaptada ao local e os saberes e práticas que as populações tradicionais desenvolviam para produzir seus alimentos.
Os SAFs abrem espaço para toda a biodiversidade, uma vez que estes sistemas têm a multifuncionalidade como uma estratégia-chave, ainda que a produção de alimentos seja a primeira necessidade que deva ser suprida. A biodiversidade local, formada por espécies não cultivadas, tem um lugar de destaque nos SAFs, por ser composta por organismos mais adaptados às condições locais e responderem naturalmente aos desígnios que a dinâmica de sucessão estabelece a cada um dos componentes dos ecossistemas naturais. Além de dinamizar os processos ecológicos, as espécies ocorrentes em ecossistemas naturais geram bens e serviços de interesse para quem maneja o SAF, como produção de biomassa, ciclagem de nutrientes, interações com a micro, meso e macrofauna, condicionadores ambientais (interferências nos fluxos de luz, água e ventos), lenha, fitoterápicos, resinas, óleos essenciais, frutos para a alimentação humana e madeira para as mais diversas finalidades.
As espécies trazidas de outros locais, com destaque para os produtos alimentares, carregam consigo um acúmulo de conhecimentos e adaptações que estão incorporados na cultura dos povos. As necessidades agronômicas, os usos, as estratégias de armazenamento, beneficiamento e transformação, as práticas culinárias e tantos outros saberes que vão se transmitindo, construindo e reconstruindo no processo de produção e consumo dos alimentos são patrimônios que precisam ser reconhecidos e preservados. As espécies cultivadas, na quase totalidade, apresentam características muito distintas das ancestrais selvagens e possuem uma grande variedade genética e fenotípica, que é resultado do processo de seleção induzido pelos povos que as domesticaram e utilizam no seu cotidiano.
No processo de coevolução com as sociedades humanas, as espécies cultivadas vão assumindo características próprias de cada local, fruto das interações socioambientais. A adaptação promove diversidade, o que possibilita usos específicos, que por sua vez necessitam de saberes apropriados que também necessitam ser conservados, recuperados da memória ou mesmo reinventados e criados.
As espécies adaptadas ao local, conhecidas como crioulas, tradicionais, "land-races", sementes da paixão ou locais materializam o conceito de sociobiodiversidade e toda a sua relevância para a soberania dos povos e segurança alimentar das sociedades humanas. No entanto, a conservação destes produtos fica ameaçada no contexto da agricultura moderna, uma vez que as condições de cultivo simplificadas e as exigências de um mercado voltado para a padronização dos produtos ofertados são antagônicas a variabilidade genética e ambiental em que emerge esta agricultura.
Esta dura realidade de simplificação do sistema agro alimentar, que parece implacável, perde completamente o sentido quando se orienta o cultivo a partir da perspectiva da sucessão natural, que é a matriz cognitiva da implantação e manejo dos SAFs complexos e biodiversos. As espécies que historicamente os agricultores utilizaram no local, adaptadas às condições ambientais com saberes, tradições, valores e significados construídos ao longo dos tempos, são componentes chaves e representam um passo gigantesco em direção ao redesenho para SAFs biodiversos e complexos.
Tanto as espécies do local como as espécies adaptadas ao local estão ameaçadas pela lógica da agricultura industrial. SAFs mais complexos e biodiversos as espécies cumprem funções ecológicas que possibilitam compatibilizar a produção de alimentos. Para as sociedades locais não degradar os recursos naturais e melhorando as condições ambientais para que outras espécies de estágio de sucessão mais avançado possam se estabelecer e produzir em locais que, em função do uso inadequado da terra, não são capazes de produzir sem aporte de nutrientes, tratos culturais que aceleram as intempéries dos solos e toda sorte de processo artificial das condições ambientais, como irrigação e uso intenso de agrotóxicos.
Os SAFs biodiversos e complexos, integrados com tecnologias sociais que tornem as relações mercadológicas mais equilibradas entre produtores e consumidores, estimulam a conservação da sociobiodiversidade e conservam os demais recursos naturais dos territórios. Apesar de toda a degradação ambiental, o Brasil continua sendo o país com maior área florestal do mundo e tem um conjunto de experiências agro florestais de referência, o que permite perceber que a política de conservação da sociobiodiversidade tem nos SAFs de sucessão um nicho ideal para a sua promoção. Estes terão um grande avanço nas paisagens rurais à medida que as políticas conservacionistas incorporem a dimensão sistêmica que orienta o conceito de sociobiodiversidade.
The sociobiodiversidad encompasses products, knowledge, habits and traditions of a particular place or territory. It is a relatively new concept, centered on the idea of identity visibility and valorization of the specificities and differences that have been conforming in historical processes of social and environmental co-evolution. This new concept was trumpeted by the International Biodiversity Convention and tries to group aspects that historically were seen as separate, but belonging to the same system, which can be which in culture, values and meanings, landscape features, products, and impacts of this same system.
Agros forestry systems (SAFs) consist of soil management strategies that simultaneously or sequentially, consortiums, trees with crops and/or intentional way, aiming creations meet desired roles by who wields the system. Among the many ways that these arrangements of cultivation can be thought of, the forest complex systems agro and biodiversity haunt us for modern societies as an opportunity to relearn to coexist with nature, since this form of cultivation of Earth seeks to mimic the processes of succession. These processes occur in ecosystems considered natural, that form without human intervention premeditated, which contrasts with the modern strategy of cultivating, which disregards the natural succession, biodiversity adapted to local knowledge and practices that traditional populations developed to produce their food.
The SAFs open space for all biodiversity, since these systems have the multi-functionality as a key strategy, even if food production is the first requirement that must be supplied. The local biodiversity, consisting of non-cultivated species, has a prominent place in SAFs, by consist of bodies more suited to local conditions and respond naturally to the designs that the dynamics of succession establishes each of the components of natural ecosystems. In addition to streamlining the ecological processes, the vector species in natural ecosystems generate goods and services of interest to anyone who wields the SAF, as biomass production, nutrient cycling, interactions with the micro, meso and macro benthos, environmental conditioners (interference in the pattern of light, water and wind), firewood, herbal medicines, resins, essential oils, fruit for food and wood for various purposes.
The species brought in from other locations, with emphasis on food, carry an accumulation of knowledge and adaptations that are embedded in the culture of peoples. The agronomic needs, uses, storage, processing strategies and processing culinary practices, and so many other knowledge that will be transmitting, building and rebuilding in the process of food production and consumption are assets that need to be recognized and preserved. The cultivated species, in almost all, very distinct characteristics of wild ancestors and have a wide variety of genetic and phenotypic, which is the result of the selection process induced by people that the domesticated and use in your daily life.
In the process of co-evolution with human societies, the cultivated species go assuming characteristics of each location, the fruit of social interactions. The adaptation promotes diversity, which allows specific uses, which in turn require appropriate knowledge that also need to be retained, retrieved from the memory or even re-invented and created.
The species adapted to the site, known as Creole, traditional "land-races," seed of passion or local realizing the concept of sociobiodiversidad and its relevance to the sovereignty of peoples and food security of human societies. However, the conservation of these products is threatened in the context of modern agriculture, since the simplified cultivation conditions and the requirements of a market focused on the standardization of products offered are antagonistic to genetic and environmental variability in which emerges this agriculture.
This harsh reality of agro-food system simplification, which seems relentless, completely loses direction when it walks the cultivation from the perspective of natural succession, which is the array deployment and management of cognitive SAFs complex and biodiverse. The species that historically farmers used on-site, adapted to environmental conditions with knowledge, traditions, values and meanings constructed over time, are key components and represent a giant step toward the redesign for SAFs biodiverse and complex.
Both the local species as species adapted to the site are threatened by the logic of industrial agriculture. SAFs more biodiverse species complexes and fulfill ecological functions that make it possible to combine the production of food. For local societies do not degrade natural resources and improving the environmental conditions for which other species of a more advanced stage of succession can settle down and produce in places that, depending on the misuse of land, are not able to produce without contribution of nutrients, cultural treatments that accelerate soil inclement weather and all sorts of artificial process of environmental conditions such as irrigation and heavy use of agrochemicals.
The SAFs biodiverse and complex, integrated with social technologies that make marketing more balanced relations between producers and consumers, encourage the conservation of sociobiodiversidade and retain the other natural resources of the territories. Despite all the environmental degradation, Brazil remains the country with largest forest area in the world and has a set of experiments agro forestry reference, which allows you to realize that the conservation policy has sociobiodiversidad in succession an ideal niche SAFs to its promotion. These will have a major breakthrough in the countryside as conservationist policies incorporate the systemic dimension that guides the concept of sociobiodiversidad..
(Texto de Joel Henrique Cardoso – Slow food )
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